cadáver e forró — falsas etimologias

Como temos visto em diversos artigos, a Etimologia é um ramo onde a imaginação muito facilmente substitui a pesquisa e o estudo, produzindo hipóteses que são muito mais atraentes do que a feia, mas necessária, realidade. São incontáveis as páginas da Internet que trazem essas etimologias de almanaque, tolinhas e divertidas, que se alastram mais rapidamente que o vírus da moda; contudo, vale aqui um princípio de ouro: quanto mais engenhosa a origem proposta para um vocábulo, maiores as chances de ser apenas uma lorota. Já vimos isso com relação a coitado, a testemunha, a canguru e a gringo. Veja agora dois outros casos do mesmíssimo quilate:

cadáver

Vem do latim cadere (“tombar, cair para não mais levantar”). No entanto, foi muito difundida no passado a hipótese fantástica de que seria um vocábulo formado pela primeira sílaba das palavras que formam a frase latina “CAro DAta VERmibus” (“carne dada aos vermes”). Esquecem que só no séc. XX começaram a surgir vocábulos a partir de siglas e de iniciais, como a famigerada Gestapo nazista (Geheime Staats Polizei — “Polícia Secreta do Estado”). 

forró 

O forró, baile animado em que se dança ao som de ritmos nordestinos, é a redução do vocábulo forrobodó, que Câmara Cascudo define no seu Dicionário do Folclore Brasileiro como uma festa popular, com música movimentada. O processo é o mesmo que produziu formas como japa (de japonês), refri (de refrigerante) ou pornô (de pornográfico). Contudo, há uma versão popular de que o nome teria vindo da leitura estropiada da expressão inglesa for all, com que os engenheiros ferroviários ingleses da Great Western (ou os oficiais da base área americana de Natal, noutra versão) avisavam os operários de que a festa era aberta para todos. Lingüisticamente, a hipótese é tola; além disso, o forrobodó já existia no Brasil Colonial, muito antes da presença de ingleses ou americanos por aqui. 

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