Junto ou separado?

Eu sempre escrevi a partir, separado. Nos anúncios deste Natal, no entanto, tenho visto ofertas de crediário com pagamentos iniciando apartir de fevereiro. O mesmo parece estar acontecendo com de repente, que andam escrevendo derrepente. Agora já não sei mais quando se escreve junto ou separado. Existe alguma regra?

Maria Divinéia C. Aracaju (SE)

Minha prezada Maria: o emprego de um espaço em branco entre duas palavras distintas foi um dos grandes avanços dos sistemas ortográficos do Ocidente. Ao contrário do que possa parecer, ele não é tão óbvio assim, e tivemos de aprender a usá-lo da mesma forma que aprendemos a usar as letras ou os acentos. Decidir quando este espaço deverá ou não estar presente depende da nossa capacidade de reconhecer os vocábulos isoladamente — o que nem sempre é muito simples, principalmente porque, ao longo da história do Português escrito, há vários casos de preposições que terminaram se juntando para sempre ao vocábulo que acompanhavam. O substantivo pressa (“eu tenho pressa“; “a pressa é inimiga da perfeição”), por exemplo, formava uma locução adverbial com a preposição de (de pressa, como com pressa, sem pressa, etc.); aos poucos, as duas partes da locução soldaram-se num bloco único, desaparecendo o espaço em branco que as separava: depressa. Ora, para escrever corretamente esse vocábulo é imprescindível, portanto, que lembremos que agora ele não tem mais aquele espaço que tinha antes.

Dentro desse cenário, podes distinguir dois tipos de erro bem freqüentes. O primeiro é separar o que a tradição ortográfica já juntou; é comum encontrar *por ventura, *de vagar, *em baixo escritos como locuções, quando deveriam estar porventura, devagar, embaixo, já grafados como vocábulos unitários. O segundo erro vem exatamente na direção contrária: consiste em juntar elementos que ainda são mantidos separados. Nesse caso, vais encontrar *apartir, *derrepente e *porisso onde deveria estar escrito a partir, de repente e por isso.

Não são erros grosseiros, se bem me entendes; apenas espelham uma hesitação natural do usuário ao se deparar com essa fronteira imprecisa entre uma locução e um vocábulo unitário, imprecisão que também vem nos assombrar no caso dos compostos. Podes entender agora o que os lingüistas descobriram na carne: não é fácil definir o que é uma palavra e o que não é. Abraço. Prof. Moreno