vinha vindo

 

Caro professor: lendo uma de suas respostas sobre pego e chego pude observar uma expressão que muitas vezes reluto em usar por julgá-la incorreta; por favor me responda se vinha vindo não seria uma forma redundante de dizer que alguma coisa vinha. Eis a frase usada em sua resposta: “Claro que responderia que não, mal sabendo ele que o controvertido “pego” vinha vindo a galope…”. Aguardo sua resposta. Um abraço.

Sônia — São Vicente (SP)

Minha prezada Sônia: o verbo vir, quando for usado como auxiliar em locuções, introduz um aspecto continuativo. Com certeza percebes que eu fazia ou eu lia não é a mesma coisa que vinha fazendo, vinha lendo. Por isso, nada contra o vinha vindo. O que te intrigou foi o uso do mesmo verbo duas vezes? Pois não te preocupes; eles não estão sendo usados com o mesmo valor. O principal (que é sempre o verbo da direita, em qualquer locução) é que significa “aproximar-se”; o outro está servindo apenas de auxiliar. Compara com ia indo, tinha tido, há de haver: também achas estranho? 

Para te tranqüilizar (e para alegria e deleite de nossos leitores), acrescento três bons exemplos do emprego de vinha vindo. Um, maroto, é da Capoeira do Arnaldo, do Paulo Vanzolini, um dos maiores letristas de nossa música popular: 

Quando eu vim da minha terra,

vim fazendo tropelia;

nos lugá onde eu passava,

a estrada ficava vazia;

quem vinha vindo, vortava

quem ia indo, não ia; 

o padre largava da missa,

a onça largava da cria… 

Depois, Augusto dos Anjos, no seu famoso Poema Negro:

E quando vi que aquilo vinha vindo

Eu fui caindo como um sol caindo

De declínio em declínio…

Para rematar, ninguém menos que o mestre Drummond, na Balada do Amor Através das Idades (quem não conhece?): 

Virei soldado romano,

perseguidor de cristãos.

Na porta da catacumba

encontrei-te novamente.

Mas quando vi você nua

caída na areia do circo

e o leão que vinha vindo

dei um pulo desesperado

e o leão comeu nós dois.

 

Depois  do Acordo:   tranqüilizar> tranquilizar