1) Silvio Gomes, de Santos, diz que sempre distinguiu o hífen do travessão (encontrável, segundo ele, digitando-se Alt+0150 no teclado numérico). Por isso mesmo, não entende por que a imprensa trata os dois sinais da mesma forma. “Afinal, eles não têm diferenças de forma e de emprego?”
Meu caro Sílvio, tens razão ao dizer que não são caracteres iguais, embora a prática da imprensa, no Brasil, esteja fundindo as duas coisas. Eu sempre os distingo, quando escrevo; abri a janela de “Symbol”, no Word, e atribuí ao travessão uma combinação cômoda de teclas. A diferença fundamental entre eles é o âmbito em que aparecem. O hífen está restrito ao âmbito do vocábulo; serve para separar sílabas ou unir os elementos que formam um vocábulo composto. O travessão é um sinal de pontuação da frase, com vários empregos importantes que serão examinados oportunamente em artigo sobre a pontuação. Uma de suas funções é ligar o ponto inicial e o ponto final de um trajeto ou de um período de tempo: a rodovia Belém—Brasília, o triênio 1971—1974, e assim por diante.
Agora, se quiseres precisão milimétrica, deves ler os livros de editoração em Inglês. Ali, eles distinguem entre o m-dash, o mm-dash e o mmm-dash — velha denominação tipográfica que se refere a um travessão da largura de uma, duas ou três letras “M“, cada um com seu emprego distinto. Abraço. Prof. Moreno
2) Prezado professor, não consigo perceber diferenças entre o hífen e o travessão, fora o fato do segundo ter mais ou menos o dobro do tamanho do primeiro. Tenho visto, em seu site, que o senhor às vezes usa o travessão duplo no lugar de vírgulas, mas também lembro que usávamos, na escola, este sinal para indicar a mudança da pessoa no diálogo. Existe uma diferença clara entre eles? Homero Z. — Goiânia
A diferença fundamental entre os dois sinais, meu caro Homero, é o seu âmbito de atuação. O hífen, presente no teclado, é um sinal que atua no interior do vocábulo; o travessão, que se obtém digitando (no teclado numérico) 0151, enquanto se mantém a tecla ALT pressionada, é um sinal de pontuação interna da frase.
É por isso que usamos o hífen apenas em três situações: (1) para indicar que dois vocábulos formam um novo vocábulo composto (couve-flor, decreto-lei); (2) para ligar o pronome enclítico ao seu verbo (fazê-lo, vendeu-o); e (3) para separar as sílabas numa eventual translineação. É por causa disso — por esse uso exclusivamente morfológico, e não sintático — que o hífen não é considerado, propriamente, um “sinal de pontuação”, mas um simples sinal ortográfico, como os acentos, o til ou o trema.
O travessão já é vinho de outra pipa; ele serve (1) para indicar, num diálogo, o início da fala de um personagem; (2) para, exatamente como os parênteses, indicar a intercalação de um elemento na frase (como eu próprio fiz, no último período do parágrafo anterior); (3) para introduzir, ao final de um argumento ou de uma enumeração, uma síntese ou conclusão (“Imagine um entardecer de domingo, escuro e frio, debaixo de uma chuva fina, numa estaçãozinha de trens do interior do estado — uma verdadeira desolação!”; (4) para indicar o ponto inicial e final de um percurso ou de um espaço de tempo: a ponte Rio—Niterói; a obra de Tobias Barreto (1839—1869). Abraço. Prof. Moreno
DEPOIS DO ACORDO — Eu já devia saber que, quanto mais rezo, mais assombração me aparece! Pois não é que esse primor de Acordo Ortográfico, que consegue ser, a cada dia, pior do que na véspera, determina, com todas as letras, que devemos usar o hífen, e não o travessão, para os dois pontos extremos de um trajeto? Ou seja, segundo eles, deveríamos escrever “Ponte Rio-Niterói“, e não “Rio—Niterói“, desrespeitando, de uma vez por todas, o limite entre o que é vocábulo composto (com hífen) do que é uma locução (com travessão)! É mais um ponto na lista do que vai ter de ser revisado por essas desastradas “autoridades”…