Professor Moreno: hoje, um aluno me questionou o porquê das palavras hífen, sêmen, pólen levarem o acento gráfico no singular e não tê-lo grafado quando plural. Fiquei mudo, porque eu não sabia responder. Não me parece correto a grafia de polens, semens e hifens sem acento, uma vez que todos aqueles casos de paroxítonos que terminam em ditongos ou nas letras L, I, N, U, R, X, Ã, ÃO não dispensam o emprego deste acento quando no plural. Entendo que homens, jovens e itens não levam acento porque suas formas de singular são grafadas sem este, mas como explicar o caso das paroxítonas terminadas em N? Seria o caso de dizer que esta é apenas uma exceção ao que se estabelece para os demais casos? Gostaria de saber como explicar mais esta exceção à regra, pelo que lhe serei bastante grato. Professor — Porto Velho (RO)
Meu prezado Professor: nosso sistema de acentuação gráfica não tem exceções, eu te asseguro (os acentos de pôr, pôde, têm e vêm não contam, porque são casos especialmente definidos). Todas as palavras que preencherem determinados critérios serão acentuadas — sem choro, nem vela. No entanto, por causa de todos esses maus exemplos de que nosso país está cheio — em que alguns poderosos ou “espertos” conseguem facilmente burlar a lei —, nossos alunos têm uma grande dificuldade em imaginar uma regra que se aplique democraticamente a todos os indivíduos semelhantes, sem haver algum “jeitinho” ou algum privilégio. Para eles, se existe uma lei ortográfica, forçosamente deve haver uma série de exceções… Ledo engano!
É importante mostrar para eles que nosso léxico se compõe de uma grande maioria de palavras sem acento, ao lado de uma minoria que vai ganhar acento gráfico. Qual foi o critério utilizado para fazer essa divisão? Muito simples: a Comissão de 1943 deixou inacentuados os vocábulos de perfil mais comum — no caso, os paroxítonos terminados em A(s), E (s), O(s), EM e ENS. Inversamente, todos os que tiverem outros finais (I, UM, Ã, L, R, PS, etc.) ficarão com acento. É por isso que escrevemos tolo, cera, coroa, totem, vezes, doce, gelo, deve, (sem acento), mas hífen, ônix, flúor, ímã, órgão, ravióli, álbum (com acento). Esta distribuição de acento nos paroxítonos vai determinar o acento dos oxítonos, classe muito menos importante:
Nota que, aplicando-se o quadro acima, homem, jovem, selvagem e item ficam no grupo dos não-acentuados, enquanto pólen, hífen, hímen ficam com acento. Ora, acontece que o plural de todos eles tem exatamente o mesmo final –ens; por isso, homens, jovens, selvagens, itens, polens, hifens, himens não terão acento (sem interessar, nesse caso, qual era a forma singular). Exceção seria — aí sim, meu caro Professor! — se a regra acentuasse hífens, pólens e hímens, mas não homens, jovens ou itens; isso seria um verdadeiro pesadelo, porque obrigaria o usuário a saber quais vocábulos pertencem a cada grupo. Trocando em miúdos: a norma estabelece que todos os paroxítonos terminados em –ens NÃO terão acento, e pronto!
Além disso, ao examinarmos um vocábulo quanto à acentuação, NÃO podemos levar em consideração as diferentes formas de seu paradigma (singular, plural, masculino, feminino). Quando dizemos que aos oxítonos terminadas em ES levam acento, não estamos nos referindo, necessariamente, ao plural de vocábulos terminados em E: japonês, português, três são bons exemplos. Escrevemos juíza, juízes e juízas com acento, mas não juiz, porque o masculino não se enquadra na regra do hiato; da mesma forma, a acentuação não precisa saber que raízes é o plural de raiz. Cada forma é examinada isoladamente; se ela satisfizer o perfil normal, fica sem acento.
Para acostumar meus alunos a esse tipo de raciocínio, sempre usei o exemplo dos verbos: saí, saíste, SAIU, saímos, saístes, saíram— a 3ª do singular fica fora da regra do hiato, mas isso não é nenhum escândalo. Pode ter certeza de que, mostrando a lógica do sistema de acentuação, o aluno vai ficar muito mais seguro na hora de acentuar — podendo, inclusive, estabelecer analogias com as palavras que ele conhece (se homem não tem acento, item e modem também não têm — e assim por diante). A Comissão de 1943 trabalhava sob o espírito democrático dos países que se aliaram contra o Eixo, na 2ª Guerra; certamente por causa disso consagraram, como princípio básico de nossa acentuação, “o que vale para um, vale para todos”. Abraço. Prof. Moreno