Embora, no Mundo Antigo, as doenças e os problemas de saúde fossem geralmente atribuídos a divindades e a poderes sobrenaturais, o trabalho de dois médicos excepcionais, Hipócrates e Galeno, lançou as bases da Medicina moderna. O grego Hipócrates (460-377 a.C) e o romano Galeno (131—200 a.C), partindo do princípio que toda doença tem causas naturais, atribuíam ao médico o papel de ajudar a natureza na cura, procurando reestabelecer o equilíbrio do organismo enfermo. Sem dúvida eles ficariam perplexos se pudessem ver o que hoje é normal para nós: anestésicos, antibióticos, exames de sangue, aparelhos de raio-x e de hemodiálise, transplantes, terapia genética, clonagem; no entanto, eles já defendiam e pregavam uma atitude de respeito ao paciente e observação cuidadosa dos fatos que até hoje norteia a prática médica; basta lembrar que o juramento de Hipócrates até hoje é proferido por milhares de novos médicos em todo o mundo. Além disso, as palavras que eles empregavam continuam a sendo usadas por nós; são as mesmas, embora o seu significado possa ter sido alterado nesses dois mil anos de História.
cirurgião — Pelos elementos gregos que o compõem, este vocábulo significa, literalmente, “o que trabalha com as mãos”. Na concepção antiga, não era necessariamente um médico. Este (chamado de iatros — daí o pediatra, o psiquiatra, o geriatra, entre outros) era o que detinha o saber teórico, enquanto o cirurgião, profissional de posição inferior, trabalhava manualmente, curando feridas e fraturas. Durante séculos, as práticas cirúrgicas foram executadas pelos barbeiros, que, além de fazer a barba e cortar o cabelo, também suturavam ferimentos, faziam sangrias e extraíam dentes. Pouco a pouco, porém, o avanço da Medicina tornou impossível essa divisão de tarefas, tornando-se impensável um cirurgião que não tenha também a formação médica completa.
câncer — Em Latim, cancer significa caranguejo, o que explica por que o nome da doença é o mesmo do signo e da constelação de Câncer. Essa denominação comum já ocorria entre os gregos, que também designavam o animal e o tumor com a mesma palavra — karkínos —, de onde proveio o nosso carcinoma. Segundo Galeno, o legendário médico romano, o nome câncer foi dado à doença porque as veias intumescidas que circundam a parte afetada têm a aparência das patas de um caranguejo; outros atribuem o nome a uma metáfora: o local do tumor é corroído dolorosamente como se um caranguejo o devorasse.
eutanásia — Vocábulo grego, composto de eu (“bom, verdadeiro”) e thanatos (morte); literalmente, seria a “boa morte”, uma morte sem sofrimento, e não tinha o polêmico significado que adquiriu atualmente. O poeta romano Suetônio conta que imperador Augusto, sempre que lhe informavam que um conhecido havia morrido serenamente, exclamava: “Que os deuses concedam, a mim e aos meus, uma eutanásia assim!”. Modernamente, o vocábulo refere-se a ajudar uma pessoa em estado terminal a pôr fim à vida, para aliviá-la de dor e sofrimento insuportáveis, o que suscita uma série de discussões no âmbito ético, religioso, médico e jurídico; uns a defendem como um ato de misericórdia e de dignidade, enquanto outros a condenam como mais uma forma de homicídio, temendo que sua legalização possa um dia se converter, como aconteceu entre os nazistas, numa eliminação sistemática de todos aqueles que as autoridades julgarem incômodos para a sociedade.
hospital — Do Latim hospes — “hóspede, forasteiro”; em Roma, o cubiculum hospitalem era algo assim como nosso quarto de hóspedes. Com o advento do Cristianismo, surgiu a preocupação de abrigar os necessitados e desamparados; assim como para os viajantes havia as hospedarias, para os enfermos sem posses foram criados os hospitais. Os nobres e os burgueses eram tratados em suas residências, mas os indigentes, incapazes ou desvalidos recebiam abrigo e tratamento gratuito nessas casas mantidas por organizações de caridade. Com as necessidades de concentração de equipamento tecnológico, no entanto, o hospital deixou de ter esse caráter exclusivamente assistencial e passou a simbolizar a reunião de todos os recursos disponíveis para o tratamento de enfermos de qualquer classe social.
hipocondríaco — Designa aquele que se preocupa demasiadamente (e sem fundamento) com a saúde, enxergando sinais imaginários de doença e fazendo queixas exageradas de sofrimento. O nome vem do hipocôndrio, região situada na cavidade abdominal, atrás das costelas, e se refere aos órgãos ali situados: o fígado, a vesícula biliar, o baço, parte do estômago, etc. Como esses órgãos (principalmente o fígado e o baço) eram, para os gregos, a sede de sentimentos como a melancolia e a tristeza, dizia-se vagamente que a pessoa estava enferma do hipocôndrio, atribuindo a uma causa física o que hoje se sabe ter fundamento exclusivamente psíquico.
paciente — Vem do Latim patientem — “o que sofre, o que padece”. Este sentido primitivo pode ser encontrado também na Gramática, onde dizemos que, na voz passiva, o sujeito que “sofre” a ação do verbo é o “sujeito paciente”. É um vocábulo de dupla significação: ao mesmo tempo que designa aquele que sabe esperar, sem pressa, o curso dos acontecimento, significa também o que está sob o tratamento de algum médico ou hospital. Aliás, o termo paciente , ao contrário de doente ou enfermo, sempre pressupõe essa relação do indivíduo com um especialista ou uma instituição; em frases comuns como “o médico visita seus pacientes”, “Freud teve muitos pacientes americanos” ou “o hospital mantém a ficha detalhada de todos seus pacientes”, seria totalmente inadequado substituir o termo por “enfermos” ou “doentes”. Alguns pacientes modernos, em vista do mau atendimento e do longo tempo necessário para marcar uma consulta nos serviços oficiais de saúde, tornam-se impacientes e preferem passar para a condição de clientes, pagando pessoalmente o médico que contratam.