Fui criticado por usar o pronome mim supostamente de maneira errada! Eu disse era para mim comprar. Agradeço sua ajuda em me orientar corretamente.
Marcos de Sousa
Qual é o certo? “É importante PARA MIM saber a verdade” ou “é importante PARA MIM saber a verdade?”
Magda
Meus prezados amigos: agrupei as perguntas de vocês porque elas complementam uma à outra.
MEU CARO MARCOS: erraste bem erradinho. Temos duas regras básicas a considerar:
1 — Quando o Português quer representar o sujeito por um pronome, usamos o caso reto (EU, TU, ELE, etc.).
2 — Os pronomes oblíquos tônicos (MIM, TI, etc.) são usados como objetos, sempre após uma preposição essencial: de mim, sem mim, por mim, para mim, etc.
Ocorre que na construção “Era para X comprar”, o pronome que entrar no lugar de X, ao mesmo tempo, (1) é sujeito de comprar e (2) vem depois da preposição para. Em outras palavras: se seguirmos o princípio de que os sujeitos devem ser representados por pronome reto, a escolha é EU; se seguirmos o princípio de que usamos pronomes oblíquos tônicos após preposição, a escolha é MIM. A solução é simples: a regra do sujeito tem absoluta precedência sobre a regra da preposição, que só vai agir quando a primeira não estiver vigente: “Ele comprou isso PARA MIM”, mas “Era para EU (sujeito) comprar”; “Vocês não vão começar SEM MIM”, mas “Vocês não vão começar sem EU (sujeito) chegar“.
MINHA PREZADA MAGDA: a frase fica correta assim: “É importante PARA MIM saber a verdade”. Para mim, aqui, não é o sujeito do verbo saber. Essa frase, aliás, ficaria bem mais fácil de entender se usássemos vírgulas (que aqui, como sabes, são opcionais): “É importante, para mim, saber a verdade”. A possibilidade de livre mudança na ordem (“Saber a verdade é importante para mim“, ou “Para mim, é importante saber a verdade”) mostra que essa não é aquela famosa estrutura “Isso veio PARA EU fazer”, em que o pronome exerce a função de sujeito do verbo e, por isso, deve ser usado no caso reto.
Nas últimas eleições, um comercial de TV que incentivava o voto consciente causou muita discussão aqui em Porto Alegre, por conter a frase “PRA MIM escolher candidato é que nem escolher feijão”. Vários leitores escreveram para dizer que a forma correta seria “PARA EU escolher candidato, é como escolher feijão”. Ironicamente, a frase estava correta; errada era a alteração sugerida. Poderíamos discutir se é adequado, ou não, o emprego informal do “pra” e do “que nem” numa campanha institucional. A pontuação também merece reparo; a frase ficaria bem melhor como “Para mim, escolher candidato é como escolher feijão“. Agora, do ponto de vista da sintaxe dos pronomes, os leitor que me desculpem: o uso do oblíquo mim está perfeito. Sei de onde veio o equívoco: nos manuais e livros didáticos de pouca ciência — infelizmente, a maioria dos que se vendem por aí — difunde-se a lenda, disfarçada de regra, de que “antes de verbo” devemos usar sempre o pronome pessoal reto: “Isso veio para eu fazer”, “Ele disse que é para eu levar os ingressos”. Ora, nesses exemplos usamos o pronome reto não por estar antes de verbo, mas por ser SUJEITO desses verbos. Na frase injustamente condenada, mim está antes do verbo escolher, mas não é o seu sujeito; isso pode ser facilmente verificado se (1) alterarmos a ordem para “escolher candidato, para mim, é como escolher feijão”, ou (2) trocarmos mim por nós, o que não afetará em nada o resto da frase: “PARA NÓS, escolher candidato é como escolher feijão” (e não *escolhermos).